terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Hipotético

Meu ponto de saída, meu subterfugiu é você. Quando eu quero idealizar situações vem tu. Tu sempre vem para preencher as hipóteses do que seria se um dia acontecesse algumas determinadas situações que eu também crio; tu vem nas hipóteses do dia que eu iria me inserindo nos teus dias e vivenciaria para além de nós, um grupo, família, povo, viagens ou, passeios pequenos. 

Minha atração venusiana insistente faz tu me visitar em alguns gêneros musicais, em alguma pessoa que nem conheço na rua; na visita a um lugar que a gente nunca foi. A gente não daria certo, sabia? Porque talvez seja algo platônico, suspeito. Quero acreditar que não daria. Ah... Mas tu é meu vicio de hipóteses. Eu sinto saudades... Da fala, do jeito que me vês, que a gente conversa, que sente, que tu és. Fica cada vez pior porque tu fica cada vez melhor e isso também são hipóteses do pouco que já vejo. Contudo, fica nisso e é só isso. Tu mexe comigo. É fato, mas és meu hipotético e só. 

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Na terapia

- Eu posso iniciar a sessão falando sobre alguns papéis que exerço, pontos focais na minha vida, depois eu vou detalhando. Especificando cada um, pode ser? O que não pode falar em uma sessão de terapia não é mesmo? Pois bem... Vou contar as minhas versões sobre o que vivo; minha forma de ver o mundo com uma liberdade de falar como se já estivesse morta: livre de julgamento com Brás Cubas. 

- Sente-se morta aqui?

- Não... Na verdade não. 

- E por que a alusão?

- Começou bem, doutor... Bem... Deve ser porque ao contar sobre muitas coisas que eu passei, elas falem de alguém que não existe mais propriamente, só os resquícios e alguns atravessamentos. Possa ser também que haja uma espécie de morte para algo reviver. No caso, eu mesma. Possa ser também que morra as minhas versões tradicionais, "adequadas" e tentativa de ser sempre muito coerente e equilibrada. 

- O que a trouxe aqui?

- O desejo pela perturbação. 

- [riso sutil] Então você sente prazer nisso? O que seria a perturbação pra você? 

- Não sinto prazer nisso, sinto prazer quando transformo as porcarias em algo bom. Mas eu tenho que saber do que realmente se trata para transformar. Não se muda o que não sabe que se deve, ou pode mudar. "Até cortas os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta o nosso edifício inteiro." Já dizia também, Clarice Lispector. E eu quero saber o que posso transformar.

Eu gosto muito dela. Não da frase em si, mas da escritora; e gosto também de Manoel de Barros. Que "transver o mundo." Inventa palavras e novos significados e contextos. Clarice eu gosto pela subjetividade, pelo olhar importante, por me ver em tantas frases, por me estimular a descobrir o que tem nas entrelinhas. Estou muito referencial de literatura brasileira não é mesmo? Me chegou essas coisas aqui. Pela sua expressão devo continuar falando. Então vou falar o que introduzi. [...]

- É muito interessante não ser julgada. Não verbalmente, nitidamente, por quem agora sabe tanto sobre mim e saberá cada vez mais. Fora você, talvez só Deus e eu saiba tanto. Que liberdade você ser um estranho condutor! As vezes eu queria saber o que realmente você pensa. Quando os clientes me falam de móveis, eu algumas vezes estou pensando tanta coisa para além dos revestimentos; estou pensando sobre eles em si, os discursos. Tem dias também, que comento na minha cabeça. E você também deve falar isso consigo. Alguns adjetivos... O oculto e mistério me atrai. Eu queria saber algumas coisas do que passa na sua cabeça como "comentador". Mas isso custaria a minha liberdade de falar tanto... Pontua pra mim. 

- Pontua? Você quer encerrar já? 

- Não. Nem todo ponto é final, né? 

- Sim... 

- Eu gosto de reticências. Tem uma tatuagem que é um ponto e vírgula para dar alusão a continuidade da vida; contra suicídio, coisa do tipo. Mas as reticencias me atraem mais. É a fala cantada, arrastada do nordeste, é o pensamento no ar, ou processo dele; a continuidade mesmo. Eu gosto disso. Já faz semanas que eu venho aqui e parece que não vai ter fim. Falante demais. Tem horas que canso dessa centralização. Há uma linha tênue na análise, entre o encontro consigo, o foco em si mesmo e o egoísmo. Eu gostaria de mudar algumas coisas pra viver no coletivo, em relação aos outros. Eu comigo mesma me dou muito bem (risos) gosto da minha companhia, das minhas formações, de quem sou. A vida é boa, mas tão cansativa. Tem momento aqui esse "foco em mim" me cansa. Falar... Falar... Tornar monstros mais reais pra destrui-los.

- Você sente que podemos encerrar o tratamento? 

- É difícil isso também. Por que você é um encontro marcado comigo mesma; me estimula, me encoraja a enfrentar, a me permitir enxergar... Mas estou querendo ficar quieta sabe? Parece que agora estou procurando problemas. E a vida não é só isso. Eu acho. Encontra problemas e resolve, encontra significados e ressignifica, encontra a origem e tira ou planta melhor na raiz, tem vezes que pensar cansa,doutor. Questionar tanto. Tem coisas que você sente e precisa apenas ter consciência do que sente com aqueles estímulos. E filtrar. "Sinto-me" bem e então faz mais disso. Vive mais isso... Não quero encerrar ainda. Tão abruptamente. Mas isso é um aviso prévio que partirei. Irei indo... Entende? Claro que entende. 

- E por que não agora?

- Você me liberaria? (risos) Por que não quero deixar de vê-lo ainda. 

- Fale mais sobre isso (risos). 

- Eu gosto do que essa expressão típica de vocês permite (risos). Mas queria perguntar três coisas sobre você que não seja invasiva. Posso?

- É importante pra você? 

- Acho que sim. 

- Por quê?

- Porque você se torna mais real. Saber algo que vem de você em si e é da sua realidade mesmo. Não só do que eu imagino. 

- Você fica imaginando coisas sobre mim? Que tipo de coisa lhe vem?

- Eu vou poder perguntar três coisas? 

- Pode. Sabendo que eu escolho se vou responder. 

- Vou também escolher não responder sua pergunta sobre o que imagino, agora. 

- (risos) Tudo bem. 

- Você joga videogame? 

- [Expressão de espanto e riso] Sim.

- [Sorriso singelo] Bom... 

- Por que quis saber sobre isso?

- Porque... É algo diferente demais imaginar sobre você. 

- E o que minha resposta lhe causou?

- Sorriso. Você viu... A gente se ver na próxima sessão. 

- (Risos) Você a encerra? Achava que você queria saber três coisas.

- Sim. Mas não tudo hoje. Deixa eu me deleitar nessa agora. E sim, eu encerro por hoje (risos).

- Tudo bem. 

- Até a próxima! 

- Até. 




sexta-feira, 2 de outubro de 2020

Amor e colorimetria

Deus deve ter feito Ana Caroline iniciando pela cabeça, fico eu imaginando... Cabelos cor de barro, meio alaranjado, meio vermelho, inspirado nos telhados das casas. Liso em cima e desceu brincando em movimento, fez ondas, o barro respingou na pele, que nem a cor definida ainda estava, então Ele deixou feito folha comum, branca mesmo, salpicada de vermelhos e marrons com um leve rosado do sangue que viajará por ela. Falando em cores, complementou o tom terroso com cor de folha, Ana nasceu com olhos verdes; narizinho astuto de quem se impõe e uma boca larga de quem não nasceu pra disfarçar sorrisos. 

Cabelos cor de telha, observo eu. Telhado dela. Cabeça boa vejo eu; boa pelos bons abraços dos seus neurônios com os pensamentos dela. Ana Caroline tem equilíbrio coerente em seu labirinto. Andava pelo mundo com a exploração de uma criança e a destreza de transformações de um adulto; andava leve, ressignificando coisas, as personificava em tratamento; um amor para o cumprimento dos seus propósitos; e no meio do caminho, tinha um André. 

André do telhado (ou cabelo) preto e ao sol azulado, diferente do cabelo de Ana, o seu já foi feito divertidamente cacheado, escondendo seus pensamentos mais mirabolantes, andava como se estivesse sempre apressado, olhar sagaz e vivo. André muito jovial olhava para as pessoas como se admira ideias. Pensava sobre, ficava articulando, fica empolgado pelas miudezas de cada um e se desinteressava muito fácil para quem só falava em grandezas de si. Ele amava o mundo. A imensidão dele e as criações. Gostava muito do natural, da natureza... E no meio do caminho de André tinha uma Ana. 

Ana dos olhos cor de folha, árvore com orvalho, verdes e brilhantes. Ana leve que pausou a correria de André. Ele não estava atrasado, ele estava no tempo certo pra encontrar a moça, mas por ela, André precisava olhar devagar. Ela acompanhou um pouco da pressa dele em viver e descobriram algo em comum, o desejo do desfrutar o que há de bom na vida, a visão para coisas do alto e o movimento estimulante do morar em uma Casa 08: a vivacidade e dom de transformar!

Transformar a casa de dentro, transformar a casa de fora, transformar casas alheias e tudo que puderem com sua imaginação e ação em melhorar. Ela uma psicóloga e artesã, ele um arquiteto e ilustrador. As artes se casaram, o Criador os uniu. Imaginem o que veio dessa união de calorimetrias? 

Amora Poema, tinha um teto cor de? Amora... Cabelos arroxeados raros de se ver, cachinhos unidos e esvoaçantes querendo abraçar o mundo, olhos cor de âmbar. Exótica e poética. Criatura de artista é arte. Arte cantada e contada é poema. Daí veio o nome dela e junto com ele uma vida de significados, que mais tarde, como seus pais, mudaria, pois ela encontrará a sua forma de contar e ver as coisas do mundo: "ressignificando". 

Imagem de Amora criada por IA. 



sábado, 23 de maio de 2020

Um presente

Eu estava estudando neurociências quando recebi uma mensagem na tela do meu notebook:

"Você recebeu um vale presente. O que você precisa saber: Será um dia de folga, com tudo pago, o tempo passará diferente pra quem não for com você e eles ficarão bem. Você não precisa se preocupar com absolutamente nada, descanse. Aceita?" 

Eu sorri sem acreditar. Aliás, duvidando. Será? Mas sorrindo e em tom de brincadeira respondi como se eu pudesse falar pra quem escreveu aquilo: "Aceito!" Fechei a janela que apareceu isso e fui dormir. Acordei com som de chuva, olhei pra cima e afastei a cortina da janela, gotas de chuva descendo lentamente; chovia forte, mas deu pra ver, que havia muito verde e uma claridade dizia que o sol já estava por ali. Fechei os olhos e fiquei ouvindo... Barulho de água forte escorrendo, não parecia ser pelas calhas, mas por riachos, estava tão bom... A cama me acolhia ali com um frio que vinha apenas do clima, sem ventilador, sem ar-condicionado. Espreguicei-me e me encolhi em meio a lençóis e edredons tão macios e alvos que poderia sugerir que estava nas nuvens. Percebi que eu estava nua. Confortavelmente nua deitada por entre as cobertas. 

Sentei na cama e me dei conta: eu estava em outro lugar. Da cama eu via uma pequena sala, mas não havia TV, apenas um sofá de madeira com almofadas volumosas estampadas com mandalas em tons pastéis, não tinha tapetes em lugar algum, nem precisava, o piso era de madeira, ao lado do sofá uma mesa lateral quadrada e com entalhes, um abajur rústico igual ao que estava do lado da cama que eu estava; do lado da luminária, caneta e papel a espera de escritos um vasinho de cerâmica branco com detalhes coloridos e uma plantinha nele. Na frente de tudo isso, uma bancada de cimento queimado e tampo de madeira; era como uma copa, alguns poucos armários, frigobar e louças brancas. Tinha uma jarra com água e flores cor de rosa seco em cima da bancada e um bilhete abaixo dela. No meu campo de visão também dava pra ver uma porta a direita e depois da copa e salinha, cortinas brancas que pareciam esconder grandes portas. Eu estava em uma espécie de chalé, com estrutura toda de madeira. Fitei o bilhete, levantei e fui até ele. 

"O café será servido na casa ao lado. Não se preocupe com a hora."  

Lembrei-me do: "Você não precisa se preocupar com absolutamente nada, descanse." Então eu estava vivendo o tal presente! Como eu cheguei ali? Não sei. Levantei enrolada em um lençol e fui a porta, supunha que ali poderia ter alguma roupa, ser o banheiro, e era. Ao abrir a porta vi que o banheiro era bem grande, o piso dele era diferente, uniforme em tom de bege, as paredes com pedras grandes em seus vários tons de marrons. Tinha várias plantas suspensas, a cuba da pia ficava em cima de uma bancada de madeira maciça e atrás dela um espelho grande, foi quando eu me vi. O cabelo solto, leve e macio, eu estava sem resquícios de maquiagem, mas não havia marcas firmes de olheiras, a pele parecia mais bonita, aproximei e vi que parecia ter passado por uma limpeza de pele, sobrancelha feita... Eu estava em um SPA? Não me lembro de nada! Meu rosto dizia que tive uma boa noite de sono e o resto do meu corpo também sinalizava isso. 

Por trás de uma cortina de conchinhas encontrei o chuveiro, ao fundo do espaço pra banho plantas e pedrisco no chão com uma parede mais atrás coberta de planta; a chuva estava caindo diretamente nas plantas, observei que nessa parte, não havia teto. Liguei o chuveiro além de a água descer, automaticamente começou uma música instrumental de gênero "profundo, envolvente e zen", eu não sei explicar. A água estava um tanto morna e ao lado da cortina havia um roupão branco e extremamente robusto e confortável só de olhar. Parecia feito com o mesmo tecido da manta da cama. Ao terminar o banho vesti. 

Fui pra o quarto e dessa vez eu vi perto da cama uma mesinha com uma pequena mala de palhinha. Lá estavam alguns pertences meus! Uma calça azul estampada de praia, uma regatinha de algodão branca, meus chinelos, entre outras coisas; arrumei-me empolgada, abri as cortinas e vi portas grandes de vidro para um jardim imenso que mais parecia uma floresta e uma ponte pequena logo na frente da varanda me ajudariam a atravessar o riacho que passava por baixo. Havia sim, águas correntes por ali, além da chuva! Eu não me molhei muito porque a ponte era coberta em cima; segui indo aonde a ponte levava. Lembrei: Estou sozinha! Radiantemente sozinha.  Sentindo bem e  amada... Quem será que me deu esse presente? 

Depois de umas poucas curvas (onde dava pra ver que havia outros chalés por ali perto) encontrei a "casa ao lado". Pequenos degraus de madeira me fizeram entrar nela. O que era pra ser a sala era um restaurante de madeira e vidro que possuía um formato que lembrava uma casa; lindo! Ali sim, tinha algumas pessoas, casais, famílias, crianças brincando em mesas menores, neném lambuzado de comida, mas as mesas eram espaçadas e eu não conseguia ouvir nada além da música e algumas risadas. As pessoas pareciam tranquilas e satisfeitas, eu estava encantada e fiquei mais ainda quando vi a mesa com um banquete! 

A mesa estava bem colorida e saborosa só de olhar. Tinha frios, folhados, cuscuz, frutas, sucos diversos, café, leite e um cardápio de comidas a mais a serem feitas. Separei o que eu comeria em uma bandeja que havia disposta para os clientes; levei a mesa e me sentei olhando aquela paisagem deslumbrante.  Quando eu terminei, uma moça veio falar comigo e me entregou um panfleto em papel reciclável que dispunha de algumas práticas disponíveis naquele lugar, juntamente com um mapa que me guiaria pra cada uma e seus horários de funcionamento. Lá havia: aulas de yoga, pilates, vários tipos de meditação, pintura, oficinas de artesanato, culinária, musicoterapia, hidroterapia, diversos tipos de massagem; salão de beleza, feirinha... Era um “mini mundo” bom, pensei. "Aqui é o céu"? 

Passei a tarde inteira entre Yoga, meditação, banho livre na piscina, massagem, aula de culinária em que aproveitei todos os meus sentidos sensoriais, dei boas risadas. Até a manicure dispunha de óleos essenciais para massagem nos pés e nas mãos, eu amei! Aprendi a fazer penteados afros também. Quase que saio tendo adotado alguma filha (risos). Fiz amizades e jantei com um pessoal "vibe" boa. Comemos pizza! Divinas pizzas de sabores inusitados que eu não sei o nome além de nomeá-las de: delícias estupendas! E tomamos vinho, brindamos, oramos em gratidão. Começamos brandos falando baixinho e depois já estávamos em conversas mais altas e sorrindo bastante. Dançamos também. Não sei explicar qual era o gênero. Era uma mistura dançante! Saias rodopiavam, calças erguidas, pés descalços ou, sandálias baixinhas confortáveis. Foi muito bom! 

Voltei ao quarto em estado de êxtase, sozinha e feliz. Amada. Foi como me senti o dia inteiro. Especial, cuidada. E foi lindo de ver que cada um parecia se sentir assim também. Tinha amor exalado pra todo mundo. Vinha daquelas plantas? "Oxigenamor"? Vinha dos céus nas gotas de chuva? Vinha da terra e alimento que nos sustenta? Vinha do sol, da noite que nos aquece e nos sombreia? Vinha de tudo. Vinha das criações do Criador. Era presente dEle mas é claro! A perfeição da sua natureza detalhada em tudo, detalhada e transmitida em nós. Essas pessoas não poderiam ser tão lindas em suas inúmeras expressões e aptidões se não tivessem um tanto de Deus em cada uma delas. 

Ahh... Foi lindo. E agradeci e agradeço por cada momento em que fui agraciada e amada. Eu não fiz nada pra merecer, mas Ele me apresentou um céu na terra pra eu saborear um pouco do muito que ainda está por vir. E já foi tanto! 


Voltei para o meu quarto/ chalé. Tomei banho sorrindo e lembrando. Fui para cama e adormeci prontamente. Acordei aqui. Aqui nesse mundo que tem um monte disso que vivi, mas de forma fragmentada e tão grandemente rara essa junção. Lembrei-me de uma música do Teatro Mágico que diz: "Tem hora que a gente se pergunta como é que não se junta tudo numa coisa só?" Há um mundo bom. Em algum tempo e lugar. Haverá um mundo apaixonadamente bom. 

sábado, 2 de maio de 2020

Ela ficou no passado

Aqueles papos na cozinha.

- Eu lembro dela. Lembro como ela era a uns anos atrás; mas lembrar dela a uns anos atrás é lembrar dela como é hoje.
- Isso não faz sentido!
- Por quê não poderia fazer?
- Porque as coisas mudam, Cidoca!
- Pois é... Mas eu não estou falando de coisas Zé, e sim de uma pessoa. 
- Pior! 
- O que você lembrar dela?
- Bem, as mesmas características que você falou. 
- Pois então, Zé! Mas isso que eu falei faz anos e você conhece ela de agora. 
- Mas por exemplo... Ela não gostava de ficar com meninas! 
- Isso é desorientação de se relacionar com alguém que faça sentido. 
- Mas está aí uma diferença!
- Não, porque antes ela também fazia e fez isso! 
- Certo, mas não foi com meninas!
- Isso só muda o "objeto" de desejo principal, no que diz respeito a aparência. 
- Mas já muda... 
- Certo. 
- E o que mais?
- Eu não sei.
- Ela não fala muito ainda, neh?. 
- Sim. E por isso mesmo não tem como você afirmar que ela não mudou!
- Estou falando do que ela mostra Zé!
- E quem disse que o que ela mostra é realmente o que ela é em si, Cidoca?
- Bem... 
- Sabia que tem algo que se chama ascendente? 
- Lá vem... 
- Chuta o que é, sua cabeça dura, debochada. 
- É o que se ascende na pessoa! hahahaha Que cresce nela.
- Hahaha palhaça! É o signo que se eleva no horizonte oriental no momento que a pessoa nasce. 
- E o que danado isso tem com  nossa conversa? 
- É porque assim... Não é o que a pessoa realmente é, entende? Como é o sol dela. Mas como ela se mostra aos outros. E deve ser isso que acontece com ela. A gente ver o ascendente. 
- Tu está usando um negócio viajado como argumento, pra defender o que você está querendo que eu acredite?
- É que eu sou de aquário. Hahahaha
- Haha e eu de Áries com num sei que lá em capricórnio! Sei nem o que isso diz, mas lembro que você já me falou. Ah! E eu acho que isso tudo não vem ao caso. 
- Lua e ascendente. 
- Zé, parou com essas coisas, mano! Tu fuma, neh?
- Hoje eu não fumei. 
- Bom pra seus pulmões, seu "féla". E voltando... O que eu quero dizer é que ela ficou no passado. Não se renova. É muito estranho isso. A pessoa tem um momento de acordar na vida, neh? Não vejo isso nela.
- Talvez seja o natural dela dormir. 
- Mas isso não existe! Uma hora dar uma agonia!
- Cidoca, na moral... Você não sabe se ela se aflige com isso, e simplesmente não conta.
- Pode até ser. Mas tipo... Isso não externa na vida dela, entende?
- Entendo. Preocupante. 
- É... 
- Mas Cidoca assim... O que a gente tem mesmo com isso?
- Tipo... Nada! Hahaha É que sei lá... Era minha amiga muito próxima, sabe? E daí não consigo mais ser e olhando assim de longe, estamos muito longe... Ela ficou pra trás. 
- Entendi... Mas, por que você não vai lá, se aproximando pra bater uns papos cabeça com ela, talvez ela se solte aos poucos e fale. 
- É que ela ficou desinteressante, entende?
- Ah vá! Esse papo todo pra tu falar isso? 
- Haha foi mal... Só viajei aqui pensando nela e quis compartilhar porque é estranho demais! Porque tipo...
- Tipo nada! Depois vem falar que eu é que fumo. Eu preciso da sua hora pra fazer o seu mapa astral e entender você melhor, sério. 
- Haha Zé tu é uma onda. 
- Cala boca desgrama hahaha, passa tua hora! 

domingo, 26 de abril de 2020

Mil melodias, uma só linguagem

Bem, hoje eu vou contar uma parte muito importante da minha história, filha; agora com  sua idade você já tem uma capacidade de entender e absorver o quão mágico pode ser o mundo, o que move algumas relações e que sim, grandes transformações palpáveis, mesmo depois de anos, podem acontecer! Acredite, isso que você está sentindo aí, vai passar e ainda terá uma história surpreendente no futuro pra você contar. 

Lívia, quando eu tinha 10 anos de idade uma enfermidade de cunho genético chamado ceratocone se agravou rapidamente e eu fiquei um tempo da minha vida sem enxergar praticamente, nada. Um tempo, assim... Mais precisamente anos! 8 anos. Eu só via tons e borrões. E isso só mudou em um período próximo a quando eu vivi a coisa mais fantástica e louca da vida, que foi quando eu me apaixonei por alguém. 

Bem, quando eu era adolescente, umas amigas e eu fomos a uma viagem no período das férias para um interior onde morava a avó da sua madrinha Ana. Murilo, irmão dela, também levou alguns amigos e logo juntamos a turma para nos divertirmos. Eu não enxergava ainda, então me descreviam alguns lugares e pelo cheiro, textura, sons, como também, pelas cores fortes, eu podia ver na minha memoria, na minha criatividade em montar cenários, o que estava a minha frente ali. 

Tomamos banho de rio no primeiro dia! O céu estava em tons de azul pincelado com rosa e ao meu ver, posso afirmar: estava lindo! [Risos] E foi nesse dia que encontrei o garoto que eu me apaixonaria, só tinha um detalhe: Ele não falava. A sua enfermidade era ser mudo. Mas ele ouvia e tocava divinamente bem. 

Nos apresentaram. Eu o senti num aperto de mão, no cheiro quando próximo (e ele cheirava muito bem!), no jeito que falavam dele, dava pra saber a "vibe". Ele começara a tocar e eu fiquei encantada, foi ruim disfarçar e ele certamente viu. Eu me perguntava: será que ele não só viu, mas realmente entendeu isso?

No outro dia seguimos comendo juntos, tomando banho de chuva, contando histórias sinistras em meio a uma fogueira improvisada; ouvindo músicas, cantando e ele com aquele violão que não saia da cola dele. Resolvemos dormir ali mesmo. Acampar. Fomos a casa da Vó Miranda, pegamos o que precisávamos e voltamos pra dormir pertinho de uma árvore, que ficava não muito longe, do rio.  

No meio da noite eu estava meio inquieta e saí para fumar. Pois é... Eu já fumei. Mas não repita isso, não vale nada! Era só bobagem da falta que fazia algo que bem, eu mudei com a terapia, filha. Mas isso é outra história. Continuando... Ele estava lá. Pertinho da fogueira ainda, eu sabia disso porque estava tocando. Eu me aproximei e não soube o que dizer. Como dizer... Ele percebeu, me tocou com duas batidas no violão diferentes e repetiu a freqüência no meu ombro. Firme, mais acolhedora. Então... Ele tocava algo e parecia falar. Sim! Ele falava por meio de melodias. Eu podia ouvir! Aqueles solos eram frases, as notas se uniam e formavam palavras e de repente naquela conexão louca, eu falei pra ele músicas que eu gostava de ouvir e ele tocou. Entendi que ele realmente estava em sintonia comigo e fluímos no mesmo ritmo por sei lá quantas horas... Riamos. E depois eu colocava em sinceridade e palavras o que eu estava vendo pelo meu coração e ouvidos, acontecer. Ele confirmava e opinava ao me enxergar, ler a coerência no meu corpo, me traduzir também e falar por meio do seu violão. 

Ah Lívia... Foi lindo! E a gente acabou se tocando algumas vezes para sentir algumas certezas de coisas que a gente não sabia dizer, a não ser por meio desse instrumento que era nós mesmos em linguagem corporal. Foi no desdobrar disso que a gente se beijou e continuou, e eu vi o sol nascer, ao sentir o calor do dia nas minhas costas. Amanheci com aquele garoto que nada falava objetivamente, mas muito me dizia.  

Nos recolhemos antes que os outros acordassem. Continuamos o nosso passeio com a turma mais dois dias e deixamos escapar a nossa comunicação. Nossos amigos ficaram espantados, porque eles não entendiam como poderíamos tão bem nos comunicar quando sozinhos e daquela maneira. Depois desses dias, voltei para capital. Ele ficou... E se tornou aquele amor de verão, sabe? Mas continuou pulsante guardado com carinho dentro de mim, porque aqueles dias tinham sido mágicos! Afinal, a gente se permitiu ir além do que poderíamos realizar com nossas limitações físicas, porque não fomos restringidos a isso. O sensorial, a mente... essa sensibilidade, o querer, nos permitiu tudo!

Um ano depois disso, realizei uma cirurgia de transplante de córneas, que me trouxe a visão por meio dos olhos novamente! Que felicidade!! Antes eu era professora de dança! E depois disso, você já sabe: Entrei para companhia de teatro e faço cenários! Como amo isso e tantas coisas mais que agora posso enxergar... 

Montando uma peça, certo dia, olha só a coincidência, ouvi alguém tocar divinamente bem para umas cenas, e era ele. Ele me reconheceu! E pelo olhar feliz dele, como também as duas batidas firmes e acolhedores, a gente se cumprimentou e sorriu largamente.
Daí surgiu uma nova história, linda e foi aí que depois veio você. 

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Somando dois não dá um

Arlete é uma moça bondosa, cheia de amigos e com o amor pulsante dentro de si, mas sofre com um problema crônico de dualidade. Bem, isso quem disse foi um psicólogo, uma astróloga, uma  mãe de santo, a líder de jovens da igreja, alguns amigos, a filosofia e o que mais ela buscou que pudesse falar sobre ela, além dela mesma (é claro).

A questão é que se isso fosse realmente um problema, era na visão dos outros, pois ela gostava da diversidade desde quando era criança. Por exemplo: Ela brincava que era mãe de gêmeos de sexos opostos, porque não conseguia querer ser apenas mãe de um por vez e essa coisa de decidir se seria menino ou menina, por que não ser logo mãe dos dois? Cor preferia? Porque somente uma? Ela amava a coleção de cores completa! Não dava pra ter uma amiga somente também; era muito mais legal ter várias! Profissão... Bem, já falavam disso quando ela era criança e ela experimentou brincando de muitas delas; gostava de ser maquiadora, vendedora, médica, construtora, decoradora, pintora, professora, atriz e o que sua imaginação viesse trazer.

Sua mãe sempre a elogiou por sua criatividade; se mantinha ocupada com o balé, com as aulas de basquete, com os encontros de rodinhas de amigos pra aprender violão; pintava o próprio cabelo, cortava também; cantava; escrevia, calculava... Era repleta de variações e enérgica demais!

Mas chegou um dado momento em sua pré-adolescência que a mãe começou a falar sobre individualidade, singularidade e absorver isso foi muito difícil. Ela aprendeu a teoria. Contudo, pra começar: ela dividia o quarto com dois irmãos, seus pais tinham duas casas porque preferiram morar longe um do outro. (Eles se separaram, depois descobriram que ainda se amavam e queriam continuar, porém a rotina era muito problemática então resolveram viver assim). Com esses exemplos, ela não via como algo ou, alguém sozinho seria bom. 

14 anos recém completados e ela sentiu vontade, finalmente, de beijar alguém. Em meio ao seu cotidiano surgiu um sentimento diferente de tudo que ela viverá: Paixão. Por um menino. Ela se gloriou por isso; gostava de meninos, apenas. "Olha só! Não sou tão problemática assim!". E mais, gostava de apenas um rapaz em especial. "Aiinnn... Ele é clássico, fala baixinho, escreve carta, educado, se veste bem, discreto, cheio de sensibilidade, força e objetivo. " Com esses pensamentos, e sentimento reciproco, o romance começou. Coisa linda, roteiro de novela das 18h. Ela apaixonada, escrevia lindamente pra ele, eles moravam distante e poxa... Aquela novela mexicana de saudades. Mas, Arlete tinha aquela característica lembra? Ás vezes quando se aborrecia de tantas perguntas ela culpava o signo: "Não tenho culpa se nasci sendo de gêmeos!"  

Conheceu um garoto na escola, "Ele é tão imprevisível, divertido, espalhafatoso... Ele dança! Nossa ele sabe jogar vôlei; vai me ensinar cálculos. Ele é muito prático. Engraçado; forte, esportivo..." E aí ela se apaixonou. O problema foi que ela não deixou de estar apaixonada pelo outro. Como pode? 

Ela ficou com os dois, mas a sua consciência falou que era errado... Mentira. Poderia ter sido isso pra história ficar mais bonita, mas o que aconteceu foi que ela só não gostou muito do beijo de um, e também não se sentiu segura porque ele não era discreto e sairia contando pra todo mundo, então resolveu ficar com apenas um. Mesmo sabendo que ela queria os dois. "Não dar pra somar agora, não é mesmo?" 
Anos se passaram e a história se repetia; porém ela nem se dava conta de ser algo com ela em si, afinal havia sentido pra tudo aquilo: Não havia encontrado ainda a tampa da sua panela. 

20 e poucos anos, ela se deparou com algo bem estranho: Estava gostando de dois, novamente, mas o curioso era, não conseguia ver muita diferença entre eles... E agora? Não tinha dilema! Não conseguia comparar; não conseguia ver quem vencia isso, não conseguia escolher, porque... Queria os dois! Poderia somar os dois agora? Seria essa a solução? Achar um que fosse tipo esses dois? Que já são tão parecidos... "Quero a fusão, e estou extremamente confusa com isso!" 

Ela se relacionou com os dois e isso lhe causou problemas internos pelos seus questionamentos sem respostas; foi então que buscou alguém que fosse a soma... E nada. Ela falou com os dois, se ela poderia de repente, ficar com ambos. Eis que veio a pergunta de um deles: "Tudo bem se você, do mesmo modo, não for suficiente pra mim e precisar arranjar outra para completar? Não a mim, no caso, e sim, meu desejo. Ou, completar você que não pode pra mim ser inteira?"

Arlete desmoronou! Em mil pedacinhos a mais... Escutar algo assim? Caiu a ficha e ela toda. Havia um problema! Ela acabou ficando sem os dois rapazes claro, porque não se pode somar os dois pra virar um e depois dois. "Pessoas não se fundem! É isso. Individualidade..." Pensou. Finalmente algo clareou em seu ser. A sua individualidade estava ferida e descoberta. Chorou como uma criança que vem ao mundo não sabendo o porque, mas cheia de sentimentos da sua história vivida e uterina. Chorou por se ver sozinha nisso, na sua estranheza de ter um problema que cresceu com ela e ela nunca tinha visto isso.  Não bastou nomearem, tentarem explicar... Não. Às vezes a gente só entende quando leva um soco no meio do ego desordeiro e infernal que pulsa. Foi aí que ela viu e sentiu, acompanhada de dois gestos (uma mão no coração e outra, na cabeça) falou: "A dualidade está aqui". 


quinta-feira, 2 de abril de 2020

O rapaz dos intervalos

Téo apareceu quando Vanessa estava em um momento de mudanças mais bruscas da vida, quando estava acelerada em um gosto enlouquecedor de viver e pôr em prática alguns devaneios. Foi a primeira vez que ele apareceu. Era virtual. Ela só via escritos dele, algumas fotos (mais dos lugares que ele esteve do que dele mesmo e ao prestar atenção em fotos conceituais (que por si só, já costumam agradá-la) sendo a maioria em preto e branco; ficou curiosa: "Quem se esconde por trás da câmera? E por que lhe falta cor?". 

A conversa fluía entre eles, sempre; desde o início. Entendiam os sarcasmos, as ironias e as bobagens um do outro. Ela se apresentava muito expressiva, sagaz na linguagem, curiosa e mística; ele zoeira, atencioso e sincero. Diante de conversas empolgantes, resolveram se encontrar pessoalmente, sair pra comer.

O primeiro encontro foi do tipo detalhista. A cor das unhas foram notadas, o desgosto por vinagrete na comida dele também, as vozes, o jeito que mexe nas coisas... E como sabiam que estavam sendo observados, se atrapalhavam, entre realidade x expectativa. Queriam mostrar o real, mas até que ponto?

[As vantagens de conhecer alguém sem amigos em comum, é que pode haver um grande perigo ou para os loucos, um grande atiçar de curiosidade, podendo ser também, de criatividade, visto que você pode escolher sobre: "Quem você será hoje? Qual a versão melhor da sua própria história ou, como você quer que ela, fantasiosamente, se pareça?"]

Quando saíram do restaurante ele a abraçou como se fosse se despedir e tentou chegar mais perto para beijá-la, foi então que a garota mudo o roteiro, pois estava muito óbvio a expectativa e ela era um pouco do contra. Ele entendeu prontamente e sugeriu que fossem andando para a casa dela que era um tanto perto, pois assim, teriam mais tempo para conversar, ir caminhando e sem ninguém para atrapalhar o desenrolar da história.

Feito menino e como se fosse pequeno, subiu numa divisória do estacionamento que estavam passando na calçada, ela, mais menina ainda, sentindo-se menor do que já é em estatura, imitou, subiu também, mas ele desceu, e ela quase caiu. Quase, porque ele a segurou. Segurou e dessa vez eles se beijaram. O tempo parou ali, deu pra ver, naquela degustação de um começo bom. Foi ele quem chamou ela de volta: "Vamos. Não podemos ficar aqui assim..." Vanessa como uma "garota bem levada", sorriu e pegou na mão dele para continuarem. Ele expressou o quanto estranho era estar de mãos dadas tão rapidamente com ela, já a moça, pouco estava se importando. Eles conversaram o caminho inteiro, ele a deixou na frente de casa, se abraçaram e se beijaram bastante e foi a partir disso que uma rotina acelerada de paixão começou. 

Com uns dias se passando teve histórias em restaurante, bar, praia a noite, cinema, casa... Era divertido, casual, rir a toa, até que falaram mais sobre as seriedades da vida. Isso assustou, Téo foi indo e ela o deixei ir. Não demorou muito, ela seguiu dando uma continuidade da vida como realmente era: um novo recomeço; pensou: Foi só um rapaz num intervalo. 

Anos se passaram e eles nunca mais se viram pessoalmente, tornou-se virtual de novo. Eles lembravam do que havia acontecido nitidamente com carinho, mas pouco falavam sobre. Passou. Até que chegou um dia em que finalmente resolveram se reencontrar, enfrentar algo; talvez, matar a curiosidade e por em provas a si mesmos. ["Somos só amigos sem mais intenções realmente?] Dessa vez Vanessa convocou e ele aceitou.  

Ao se encontrarem, pareceu comum e estranho se verem, afinal conversavam tanto pelo celular que não parecia ter passado anos. Mas ao mesmo tempo, estavam diferentes, pois os anos dão acabamento em muitas arestas. Foi nítido, o quanto ficavam perto mostrava que queriam um pouco mais. Depois Téo revelou e Vanessa também foi recíproca: Queriam ter se abraçado mais, mas poderia ser estranho querer isso de um amigo virtual.  

Alguns meses se passaram e novamente chegou um tempo em que a vida dele estava em um momento de transição, a dela também e foi então que se esbarraram de novo, nos intervalos. Começou: Restaurante, cinema, casa, bar, casa, casa... O roteiro ficou diferente. Conhecer a família, os amigos, as casas, os receios, os sonhos, não esconder mais o que sente e então foi dessa vez que Vanessa se assustou, alguns princípios dela haviam mudado, pra ele acompanhar, seria se refazer em alguns aspectos e ela não queria que ele pagasse pra ver, pois não era garantia que ela esperaria e realmente se satisfariam; ela se assustou e se deixou ir, pra longe; começando de novo, do mesmo lugar, mas modificada pelo intervalo. 

Voltaram a conversar, virtualmente de novo. Melhor. Duas vezes em pouco tempo de muita realidade, não deu certo. Por que? Porque eu acho que as histórias curtas e intensas a gente deve preservar enquanto está bom. Isso digo eu, partindo do ponto que me coloquei como roteirista. 

Mas posso confessar? Vejo nela saudade dele, hoje. Isso mesmo. Não para se ver pessoalmente, ou algo mais. É coisa dos intervalos mesmo. Ela está em um e ele fica pulsando; contudo, agora com total convicção: Vanessa está com saudade do seu amigo virtual, o rapaz dos intervalos. Na verdade, a vida sempre tem muitos intervalinhos, não é? Ou será que ele passou a ser parte de uma frequência da vida dela e ela não reconhece isso? Ah não sei... Apenas afirmo que ela está com saudades do amigo virtual dela, é isso; e diante do histórico de realidades que foram de amizade colorida, ela vai dar continuidade a virtualidade, por que? Eu já expliquei sobre as pequenas boas histórias. 

"Vou convocá-lo pra gente jogar alguma partida on-line!"