Ela é moça de passo curto porque a sua estatura também não permite que suas pernas sejam longas; o formato do corpo é tipo um violoncelo; cabelinho curto castanho com ondas e ela nem sabe que não deveria insistir em tirar essas curvas do movimento natural do cabelo dela, pra quê? É tão bonito quando ela gargalha e os seus cabelos dançam, os olhos apertam e choram de tanto sorrir. Ela é engraçada tanto quanto esquentada. Nem sempre foi assim, mas a vida foi ensinando ela a ser mais ousada e impulsiva. Será que os astros explicam essa mudança? Na verdade, precisamos de uma vida toda pra sabermos quem somos. A gente passa o todo tempo todo aqui nos descobrindo... Nos enrolando e nos descobrindo. Falando em enrolar, deixa eu contar uma.
A moça bonita, inventou uma arte depois que não era mais moça. Sendo mulher, uma mulher experimente segundo ela, cismou que amar alguém é se prender e sofrer, então decidiu amar a vida e aproveitar de uma forma mais ampla. Não é coisa de relacionamento aberto, porque eu acho que nem combinado ela quer mais fazer. Ora, mais fácil e claro é o titulo de solteira. A mulher arteira, cujo nome é Flor, amacia os corações dos homens dispostos, iludidos com o sorriso dela e seu jeito educado de rainha sonsa. Acho que ela desperta curiosidades. Ela causa dúvidas, o que eles não sabem é que ela mesma não decide se vai ou se fica. Aliás, quanto tempo fica.
Bem, em uma das suas viagens, numa das cidades mais coloridas do nordeste, no calor de vestir regata e alcinha, de franzir a testa mesmo com óculos escuros, Flor conheceu um guia turístico dançando numa roda de samba, logo ela que gosta tanto de liberdade, de passear. Ficou encantada! Muito sabida, aproveitou a dança! A partir daí, ela aproveitou as paisagens, aproveitou o cortejo e se aproveitou do homem, coitado. Iludiu o coração do viajante sonhador, o homem mais cheio de liberdades e com pé enfincado na teimosia de insistir que com ela queria mesmo era ficar. Fazer porto seguro, lançar âncora... Mas Flor foi embora pra suas terras e deixou o pobre homem, Geraldo, com o coração partido.
Passou alguns meses e ele ainda procurava Flor, não deixando ser esquecido de tanto que mandava mensagens, ligava, enviava presentes; tanto contato fez que a mulher se assustou e se irritou a ponto de inventar desculpas e de não querer mais. Porém, chegou um dado momento que ele tocou no ponto fraco dela. O drama. A história trágica de um bom livro de romance. A compaixão, aproveitar cada minuto que resta na vida de um moribundo que deixará saudades e partirá menos infeliz. Perfeito.
Geraldo, sofreu de doenças graves e quase se vai jovem, mas superou, eis que fazendo exames surgiu a suspeita de novo. Doente, talvez agora a morte finalmente o leve... E assim, como ela não faria os últimos desejos dele? Foi então que ela passou a alimentar a paixão do moribundo, marcar encontros, dar chances, deixar ele menos infeliz. Prometeu os céus e quase as terras numa mistura de "não quero que ele morra", mas se ele for, vai ser um final, de novela muito bom.
Era tão preocupada e nervosa que o homem sentiu o gosto da paixão que a pena pode conceder. E há quem goste! Mas ele tão iludido, achando que aquilo já se transformava em algo bom, que ele queria mais era viver para estar com aquela mulher! Não perdeu as esperanças e foi atrás de outros médicos e mais exames. Eis que [eu não sei se a paixão, a compaixão, a fé, a sorte, o amor, as orações ou as macumbas do moribundo] nada mais ele tinha, se é que teve, fica aí o questionamento.
Foi assim que Geraldo, saudável e feliz para enfrentar os quilômetros e ver novamente sua amada deu um tiro no próprio pé. Contou a ela. Pronto, acabou a paixão da farmacêutica [ havia esquecido de dizer a profissão dela]. Não havia remédio porque ele não precisava de um! Nem ela mais seria o seu remediar. Ela entrou em desespero: "E agora o que faço se ele ficou vivo? Achei que iria morrer!"
Vi Flor enrolada nas suas próprias invenções. Fiquei curiosa como ela iria se sair dessa. Pois, aconteceu que a criatura aproveitou uma mulher atrevida que passou no caminho, inventou uma história que só fazia sentido na cabeça dela e da outra que era comparsa das artimanhas dos amores soltos e o homem ficou questionando até mesmo a sua reputação! Depois disso ele se chateou e se afastou; mas não desconfiou do plano da amada, claro.
Finalmente, ela ficou livre! Mas, logo começou a sentir falta de Geraldo. Ora vejam só! E o homem, abestalhado caiu na dela de novo! Foi assim que ela voltou a sorrir (inclusive da cara dele) e tomou o lugar que era de direito dela: a rainha sonsa e arteira, que nessas horas mais parece uma menina trapaceira!